No
começo deste ano, a minha família quase inteira foi pra Porto Seguro. Dos que
não foram, somente eu não saí da minha cidade. Os outros ou foram para outras
praias ou estavam em lugares bem mais interessantes.
Porto
Seguro. Isto me lembrou de uma história.
Quando
eu tinha uns 14 anos e estava na 8ª série, a escola organizou uma excursão para
Porto Seguro para comemorar a formatura. E minha mãe deixou que eu viajasse.
Que adolescente não ficaria feliz e empolgado com uma viagem destas? Eu fiquei.
Acontece
que eu fiz alguma coisa ruim. Uma desobediência, uma resposta torta, um
palavrão gritado ou uma briga de pancadaria com sangue com as minhas irmãs.
Juro que não lembro o que fiz de errado. Eu só sei que minha mãe fechou a cara
e praticamente não falava comigo. E quando falava alguma coisa, era de forma
agressiva, brava. Acho que foi uma semana inteira assim. A semana anterior à excursão.
No
dia da viagem, ela me disse o seguinte:
—
Você vai viajar e vai ficar uma semana. Eu quero que você use este tempo para
pensar no que você fez. E quando você voltar, a gente conversa.
Eu
fui viajar com o meu psicológico confuso. Meio feliz pela viagem e meio triste
pela semana desgastante que passou e, principalmente, pela bomba que eu ia
enfrentar quando chegasse em casa. Até hoje eu não sei o que fiz de errado para
desencadear tanta agressividade para cima de mim. Eu juro, aos 36 anos ainda me
pergunto confuso “O que eu fiz naquela época?”.
Na
hora que minha mãe me falou que iam para Porto Seguro, automaticamente me
lembrei daquela semana que antecedeu à viagem e me refiz a mesma pergunta.
Enquanto
eles estavam viajando, por acaso assisti a um vídeo do Mário Sérgio Cortella chamado
“Como identificar gente arrogante”. No final do vídeo ele, dando um exemplo
sobre assédio moral em empresas, diz “Olha, eu estou prestando atenção nas suas
coisas. Vai para casa, é fim de semana, aproveite. Segunda-feira, eu converso
com você.” E aí, ele explica “Isto hoje é considerado assédio moral, com toda
razão, porque isto faz com que a pessoa se sinta aterrorizada.”
Aterrorizada.
A palavra era esta, mas na minha cabeça ela logo foi substituída por outra:
terrorismo. Terrorismo psicológico. Algo que tira sua alma, mas deixa a sua
vida. Algo que tira a sua felicidade e deixa o pânico.
Na
semana que passei em Porto Seguro, com 14 anos, posso dizer que consegui ser um
adolescente normal. Apesar deste tipo de ameaça ser o gatilho da minha
ansiedade, eu ainda não era ansioso. Eu não ficava o tempo todo imaginando o
que ia acontecer quando eu chegasse em casa. Mas eu imaginei várias vezes. E
sempre era nos momentos em que eu estava mais feliz.
Se eu
estava me divertindo e rindo bastante, do nada eu me lembrava da ameaça e
imediatamente ficava triste. A diversão perdia a graça na mesma hora.
Este
tipo de situação passou a ser muito comum comigo ao longo da vida. E apesar de
achar que isto já acontecia antes, foi o episódio da viagem que me fez definir
com certeza uma idade em que eu já tinha certos tipos de pensamentos.
É
muito estranho sentir tristeza nos momentos em que eu deveria sentir felicidade.
Mas isto acontece comigo e eu culpo as pessoas que me assediaram, que me
espremeram até a última gota, que me ameaçaram para se sentir fortes, que me
torturaram para eu me sentir fraco e desprezível. Eu era inocente e bobão, não
podia me defender. Eu acreditava nos mais velhos. A culpa é destas pessoas que
fizeram apenas uma coisa comigo: terrorismo.
Eduardo
Franciskolwisk